quarta-feira, 4 de julho de 2012





DO MEU SERIDÓ EU NÃO ABRO MÃO!



Quem muito caminha por mundos e terras alheias, contrai saudades do lugar onde mora, isso porque conhece culturas, povos e costumes aonde se anda, e extrai um pouco das expressões de cada paisagem... Hoje vejo o quanto isso é verdadeiro, mais acrescento que não é preciso ir tão longe para compreender os elementos da sabedoria configurados num mundo com formas de viver tão dialéticas. Para sentir saudades basta conhecer o Seridó.
Para quem conhece o Seridó, região interiorana do sertão do Rio Grande do Norte, viajando por suas cidades e povoados, sabe o quanto é originária a forma de vida de nossa gente, por aqui ainda há lugares, no meio de serras e lugarejos, que preservam a ternura e a maneira cordial de viver, sem que os atropelos inúteis da modernidade do capital tenham desvirtuado seus princípios fundamentais, valores e olhares sobre a terra, a família e as saudáveis tradições. No Seridó, apesar dos pesares, ainda somos gente.
O Seridó tem nas suas entranhas, lugares onde a memória de sabores e linguagens dá formas a imagens e identificações que respiram o ar quente de um sertão puro, esculpido na rocha sedentária do trabalho e cultivado pelos códigos de honra da coragem, da palavra empenhada, da bravura do gibão de couro, do cabo da enxada, da lida do gado, da violência mitificada dos homens “brabos”, da miscigenação da natureza nua e crua, e da defesa do feminino mariano, de pureza virginal, de proteção materna e pecado original.
O Seridó, erguido no chão brasileiro e corroído pelas traições de uma classe governante de coronéis e usurpadores da esperança de um povo honesto, é também resistente, se faz metáfora para parecer ingênuo, mas tem malícia para se convencer de que as maldades dos homens também sucumbem no seu leito de mortes mal morridas, vitimados pelos dissabores e descontentamentos de um atraso de vida que se confunde com a vida desejada.
O Seridó é mesmo assim, poço profundo de sentimentos coletivos, alheio às linguagens impositivas das modernidades predadoras. Prefere ser medievo, cultua suas histórias escondidas e faz coro a suas estórias repetidas, não se aliena com promessas fáceis de riquezas sem antes não pagar as promessas negociadas com os santos do lugar. O Seridó ainda prefere os santos que os homens, os santos curam, protegem, acalentam e consolam; nunca mentem, são sinceros e verdadeiros, estão sempre lá, nos oratórios, capelas, igrejas e catedrais, prontos para ouvir e atender a quem lhes procuram com sua fé de remover montanhas. Já os homens, ah bom! Esses nos enganam há séculos, são ambiciosos, querem o poder, roubam não só as riquezas, mas corrompem também a esperança, e roubar-nos a esperança é decretar pena de morte, e o Seridó não gosta de quem lhe rouba a esperança, é um bem valioso, serve de referencia para conversar com Deus, e Deus por aqui ta em todo lugar, chega num pingo de chuva, e desmorona pelo sertão adentro em gotas d’água que nos enche de alegria. Tememos a morte, tanto quanto a cultuamos em ritos e orações, mas nem a morte destrói um sertanejo do Seridó, pois depois da morte ainda resta à esperança.
Então começo a compreender que o Seridó não é só uma terra de homens e mulheres, o atraso aqui proclamado pode ser também um muro de proteção contra as inutilidades das cidades grandes, com suas vidas descartáveis e seus sorrisos poluídos. O Seridó ainda é um lugar sacro, quente, rochoso e seco como o inferno de Dante, imensurável na sua identidade de lugar, berço acolhedor de muitos povos. Não queremos que seja tão moderno, senão deixa de ser terra simples e vira mercado promíscuo de uma Sodoma corrompida por práticas distorcidas e desnecessárias, que desvirtuará a esperança e assassinará o Deus que habita por aqui...

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